Com produções para streaming e cinema, crianças e adultos, Tortuga Studios se destaca no mercado de animação

Há 15 anos no mercado audiovisual, a Tortuga Studios é uma produtora de conteúdo de séries e filmes, com destaque especialmente para suas produções animadas. Neste ano, a Tortuga lançou a primeira animação brasileira inédita no catálogo da Disney+, "O Pergaminho Vermelho" (foto), dirigida por Nelson Botter Jr. O filme conta a história de uma menina que se intriga ao perceber que todas as crianças têm pesadelos recorrentes. Ao encontrar um pergaminho vermelho, a garota, Nina, é transportada para um mundo novo, chamado Tellurian. Lá, ela conta com a ajuda de um grupo para derrotar Lorde Dark, o "senhor dos pesadelos", e assim voltar para casa com sonhos bons. 

"A história conta com uma protagonista feminina e fala de amor, família, superação, responsabilidade e transição da infância para a adolescência", definiu o diretor em uma entrevista exclusiva para a TELA VIVA. "Para nós, ter lançado na Disney foi um verdadeiro prêmio. O projeto foi cheio de desafios. Chegou um momento em que ficamos preocupados com que tipo de filme conseguiríamos entregar, se ele atenderia nossas próprias expectativas, antes mesmo do que de público e mercado. Então foi uma recompensa para nós e para todos os profissionais envolvidos, que são mais de 100. Uma produção que, apesar de ter sido feita com pouco dinheiro, foi feita com a maior qualidade possível", completou. 

Escrito a "oito mãos" por Nelson Botter Jr., Fernando Alonso, Keka Reis e  Leo Lousada, o filme levou, ao todo, dez anos para ficar pronto. Alonso, outro diretor da produtora, também durante bate-papo exclusivo, detalhou: "O projeto nasceu como uma história infantil de viagem no tempo. Tivemos a primeira ideia e, aí, ela foi se transformando. Submetemos o projeto para o Kidscreen em 2009. Chegando lá, ele foi selecionado entre os quatro finalistas. Na época era uma série e foi justamente o VP da Disney na época que sugeriu que a gente o transformasse em filme. Começamos a remodelar e buscar financiamento junto ao Fundo Setorial. Essa parte foi a mais desafiadora. A ideia original era 3D, mudamos pra 2D, tentamos injetar parte dos recursos com investimentos próprios da produtora e seguimos nessa busca para levantar dinheiro". 

Nelson Botter Jr. é um dos diretores da Tortuga Studios

Botter Jr. revela que eles conseguiram levantar só 50% do valor que precisavam no FSA e, por isso, completaram o orçamento por conta própria. "Até tentamos outros caminhos, como investimento privado, mas naquela época existia uma descrença muito grande com a animação brasileira. Investidores do mercado queriam exemplos de animações brasileiras que tivessem feito sucesso lá fora e nós não tínhamos. Hoje, nossa animação é bem mais reconhecida no mercado, principalmente internacional. Já existe a possibilidade de levantar dinheiro de investimento privado", aponta. 

"O Pergaminho Vermelho" foi finalizado no primeiro trimestre de 2019 – até então como uma obra para ser lançada nos cinemas no ano seguinte. A produtora segurou ao máximo ao lançamento, até que decidiu buscar uma plataforma de streaming. Foi quando a Vitrine Filmes entrou no projeto e fez a ponte com a Disney. "A Disney já conhecia nosso trabalho. Uma série nossa, 'A Mansão Maluca do Professor Ambrósio', uma coprodução com a TV Rá-Tim-Bum e a TV Cultura, foi exibida pelo Disney Channel. Então acho que eles se interessaram pelo filme porque já conheciam nosso trabalho e também porque ele está muito alinhado às temáticas da Disney", opinou o diretor. 

Streaming e animação: uma relação antiga 

Fernando Alonso comenta que a animação já está presente no streaming mesmo antes das plataformas "oficiais", isto é, a majors do mercado atual: "Já existia muita animação nos pequenos streamings, que ficavam de fora do radar, além das plataformas específicas de animação – de anime, para crianças, entre outros. Fora toda parte de conteúdo no YouTube. Sempre achamos que era uma questão de tempo até o streaming ser dominante. E animação viaja mais fácil mesmo – por isso é uma oportunidade incrível, especialmente no Brasil. É uma tendência forte e irreversível". 

Botter Jr. completa: "A animação adulta nas plataformas é um dos nichos do audiovisual que mais está crescendo hoje. A curva de ascensão, junto dos documentários, é impressionante. Há um mercado grande do gênero ainda há ser explorado. A maioria das produtoras se concentra na animação mais tradicional, que é a infantil. Mas, agora, parece que estão começando a enxergar uma animação adulta para além da comédia. Hoje há até dramas em animação. E concordo que o streaming seja uma tendência irreversível. Eu moro na Europa e, aqui, até quem quer ver TV aberta vê pelo streaming". 

Fernando Alonso é o outro nome por trás do sucesso da empresa

Animação para adultos 

Falando nisso, "Nosso Louco Amor", um dos próximos projetos da Tortuga, é uma animação voltada para o público adulto. O filme acabou de sair da fase de pré-produção e está sendo animado no momento. A estimativa é que ele esteja pronto entre abril e maio de 2022, para estrear no circuito de festivais e, depois, ser lançado nos cinemas, com distribuição da H2O Filmes. 

"Era um live-action mas, por conta da pandemia, transformamos em animação. A gente manteve a essência do projeto – ainda é a mesma história mas, ao transformar em animação, incorporamos uma série de coisas que não conseguiríamos no live action, já que existiria uma limitação. Conseguimos, por exemplo, colocar elementos fantásticos. Tem um personagem, um psicanalista de 65 anos, que está num princípio de demência. De repente, ele começa a esquecer algumas coisas e a doença vai ficando cada vez mais presente. Ele começa a ter delírios, e foi aí que colocamos elementos de fantasia. Deixou o filme mais poético. São cenas bonitas, que tocam. E expressam coisas que no live-action seria diferente", contou Botter Jr. "Nosso Louco Amor" é uma produção da Tortuga Studios que contou com parte dos recursos do FSA e parte ainda em captação. 

Para Botter Jr., existem algumas diferenças relevantes entre a animação para crianças e para adultos. "A infantil exige menos complexidade na história, o que se reflete também na animação, nas expressões dos personagens. Na animação adulta, especialmente esta que estamos produzindo agora, essas expressões dos personagens são muito importantes – eles precisam realmente transmitir a emoção do que está sendo dito. Existe um cuidado maior de casar expressão e voz. Além disso, existe uma expectativa do público de ver alguma coisa que remeta ao live action, que deixe aquilo mais crível, menos lúdico e menos fantasioso", cita. 

A animação "Save The Tree" estreou este mês nos cinemas da Europa

Coprodução internacional 

Depois de produzir "O Pergaminho Vermelho", a Tortuga acaba de lançar o filme "Save The Tree" no mercado internacional. Distribuído pela Filmax, o longa é uma coprodução entre Brasil, Espanha e México e está disponível nos cinemas espanhóis desde o último dia 22, com lançamento em outros países da Europa nas próximas semanas e, no Brasil, até o fim do ano. 

A trama gira em torno de um mundo cada vez mais afastado da natureza e uma sociedade distante do meio natural, mas nem sempre foi assim. Segundo as lendas, as árvores, desde a floração até a morte, são acompanhadas por duendes, que são seus protetores. No entanto, agora que as cidades estão ficando cada vez maiores, as árvores estão se perdendo, e, com elas, seus goblins. E, para recuperar a magia, só existe uma maneira: salvar as árvores. 

"A coprodução internacional hoje é um dos caminhos mais interessantes para os produtores audiovisuais, pois além de haver um intercâmbio de métodos e técnicas com modelos estrangeiros, a divisão de tarefas e financiamento proporciona a viabilização de projetos maiores e mais  robustos", afirma Alonso, um dos produtores. 

Perspectivas para o futuro 

Para Alonso, a palavra que melhor define o futuro é "desafiador". Ele explica: "Tem muita oportunidade surgindo, isso sempre tem, mas as coisas pedem uma reinvenção. Cada hora temos que lidar com uma situação diferente, uma dificuldade a mais. E aí temos que ir tentando achar brechas. Tem mais opções com o streaming mas, ao mesmo tempo, eles começam a fazer o papel que a TV tinha antes. Ou seja, o mercado mudou, mas não mudou tanto. Ainda precisamos de incentivo, a indústria não se consolidou sozinha. Ela vinha nesse processo, mas descemos alguns degraus. Vejo o futuro com entusiasmo, mas não é um caminho fácil". 

Já Botter Jr. reflete: "A gente já vislumbrava essas crises lá atrás, então meio que nos preparamos para isso. Nunca fez parte da nossa estratégia depender somente de incentivo governamental. Sempre tivemos esse viés de buscar investidores privados, além de coproduções internacionais. Fizemos esse movimento há anos atrás, quando eu saí do Brasil. É um intercâmbio valioso não só pelo lado financeiro, mas também pelo artístico, organizacional e de cultura de trabalho". 

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