Em nota publicada esta semana, a Coalizão Direitos na Rede (CDR) defende que o substitutivo do PL 2370/2019, da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), seja melhor debatido com a sociedade antes da sua discussão no plenário da Câmara. O texto, que trata de direito autoral, ganhou um novo fôlego após receber os trechos de remuneração de conteúdos jornalísticos e direitos autorais do projeto de lei 2.630/2020, o conhecido PL das Fake News.
Para a CDR, as atuais mudanças feitas no texto pelo seu relator, deputado Elmar Nascimento (União-BA), trazem novos temas que até então, não foram objetos de um amplo debate público. Para a CDR, isso significa um debate equilibrado a fim de afirmar direitos, tanto de quem usa as plataformas, como de quem produz as obras ou atua na sua execução.
Nesse sentido, a rede de entidades que atuam na defesa de direitos digitais aponta que é preciso um esforço de todos para que a proposta não venha a inviabilizar o compartilhamento comum de conteúdos na Internet ou transformá-la em um negócio restrito a atores com certa capacidade econômica, aproximando o ambiente digital dos modelos tradicionais da indústria cinematográfica e musical; que o texto final reconheça e proteger legítimas limitações e exceções aos direitos autorais que favoreçam a sociedade e o acesso ao conhecimento; e que venha a salvaguardar direitos humanos de usuárias e usuários de internet, como a liberdade de expressão.
A atual versão do relatório do deputado Elmar Nascimento suprime parte significativa do texto original da deputada Jandira, descartando por um lado, disposições que ajudariam a resolver ambiguidades da Lei de Direitos Autorias (LDA) e, por outro, alterações benéficas que estavam previstas e que são comuns em legislações mais avançadas de direitos autorais.
"O substitutivo parece cometer um equívoco não só por sua tentativa de ser maximalista nos conceitos e abarcar o máximo possível de situações em seu teor, mas também por criar um sistema novo de remuneração sem estudo anterior ou investigação de impacto", diz a CDR na nota.
A nota pública divulgada esta semana cita, por exemplo, art. 5º, XV, do texto, que, diz a CDR, é, aparentemente de forma proposital, bastante amplo. "Todas as empresas que tenham alguma atuação na Internet, independentemente de seu tamanho ou finalidade, são agrupadas na mesma categoria, resultando em um tratamento uniformizado para um pequeno blogueiro sem fins lucrativos e uma multinacional de streaming ou de rede social que utilize intensivamente obras intelectuais em seus serviços ou produtos", explica.
Outro artigo apontado com problema é o art. 88-A. Segundo a CDR, ele cria uma abertura perigosa para inviabilizar, dentre outros exemplos, serviços online colaborativos e que permitam uma maior contribuição de usuários, como fóruns e wikis, além de afetar negativamente a Internet como um meio de troca de informações e obras lícitas, por tornar necessária uma assessoria jurídica para que a pessoa leiga possa colocar com segurança qualquer tipo de obra na Internet.
Obras religiosas
A CDR também critica o destaque dado no relatório para as obras de natureza religiosa. "Obras de natureza religiosa já estão protegidas e não devem ser diferenciadas de outras obras protegidas por direitos autorais. O art. 7º, II, que protege obras de natureza religiosa, pode abrir espaço para abuso no exercício do direito autoral, na medida que sem a disposição a obras destes temas já seriam normalmente protegidas pelos direitos autorais, desde que fossem caracterizadas, como qualquer outra obra, por um grau mínimo de criatividade (ou seja, originalidade subjetiva)", explica a CDR na nota.
Remuneração de conteúdos jornalísticos
Sobre a remuneração de conteúdo jornalísticos, a CDR aponta a preocupação sobre o desenho da regulação proposto no relatório do deputado Elmar Nascimento. A rede de entidades explica que é importante que este desenho tenha aderência com a construção de uma imprensa pujante, plural, livre e sustentável. Dessa forma, é importante que esta medida proteja experiências jornalísticas operados por organizações de diversos tipos e tamanhos, preocupadas em valorizar seus profissionais e em produzir conteúdo a partir de critérios éticos. "Isso implica dizer que o reconhecimento de um dever de remuneração não deve ser construído como uma brecha para que modelos de negócio predatórios, caça-cliques ou sensacionalistas sejam ainda mais privilegiados no ambiente digital", aponta a CDR.
E prossegue, afirmando que a obrigação de remunerar estes conteúdos deveria estar restrita às grandes plataformas de Internet, como faz o PL 2630/2020, ou pelo menos a atores que utilizem o material jornalístico com algum intuito de lucro direto ou indireto, sob pena de consolidar ainda mais a centralização da rede em poucos e gigantes agentes econômicos.