Entre covers no TikTok e processos judiciais envolvendo artistas globais, a inteligência artificial está revolucionando a indústria musical.
Ao oferecer novas perspectivas para a produção de conteúdos musicais – incluindo a possibilidade de imitação de cantores, músicos e compositores – o uso de IA abriu portas para novos desafios que ainda parecem distantes de serem superados.
Até então, a imitação de vozes humanas tem sido um dos principais usos da IA na música. Através da reprodução dos padrões de fala, timbre e entoação, são capazes de criar imitações impressionantes até aos ouvidos dos próprios artistas.
Nas redes sociais, os principais conteúdos compartilhados mixam a imitação de vozes ou fraseam instrumentistas famosos. Ou seja, são um novo tipo de mídia ainda sem nome, são uma mescla entre cover e deepfake.
Enganação ou competição
Entre os casos de maior repercussão, destacam-se dois episódios: a música "Heart on My Sleeve", gerada por IA com base nas vozes de Drake e The Weeknd – retirada dos serviços de streaming pela própria Universal Music após viralizar no TikTok – e a tentativa de David Guetta em replicar a voz de Eminem através da IA – que foi publicada como um teste, sem interesse comercial no lançamento do conteúdo.
Apesar das inúmeras possibilidades oferecidas pela IA na música, ainda existem aspectos a serem superados.
É preciso questionar: até que ponto esses conteúdos apresentam o potencial de enganar o ouvinte e, consequentemente, competir com a obra original do artista ou com o fonograma da gravadora? Como podemos encontrar o equilíbrio entre a utilização da IA e a preservação da originalidade e identidade artística?
Legislação
No que diz respeito aos desafios jurídicos, atualmente, a Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/98) se aplica, exclusivamente, a obras criadas por pessoas físicas, em outras palavras, seres humanos.
Existe uma lacuna legal sobre as obras geradas pela IA. Então, quem teria o direito de reivindicar a autoria de uma obra musical gerada por IA? E se a música criada por IA reproduzir a voz de um artista falecido – como no caso do dueto entre Matuê e Chorão?
Desde o emblemático caso The Next Rembrandt, em 2016, os juristas vêm apresentando algumas possibilidades para lidarmos com a IA:
1. Considerar a obra em domínio público;
2. Atribuir a titularidade à empresa criadora da IA;
3. Considerar o usuário como titular dos direitos autorais;
4. Ou criar uma modalidade de Direito Conexo – o direito de intérpretes, músicos executantes e do produtor fonográfico responsáveis pela gravação do fonograma –, capaz de oferecer uma remuneração aos desenvolvedores do conteúdo.
Quanto aos desafios mercadológicos, baseada em um sistema de detenção dos direitos autorais, observamos impactos diretos na arrecadação na indústria fonográfica – especialmente em casos de músicas geradas a partir de conteúdos preexistentes ou a partir da imitação de artistas e compositores.
Buscando proteger seus interesses e garantir uma remuneração justa pelo uso de suas criações, os principais players da indústria já se mobilizaram quanto ao tema.
Entre os casos recentes, destacam-se a remoção de milhares de músicas feitas por IA do Spotify e a declaração do SAG-AFTRA (sindicato dos atores e intérpretes de voz nos EUA) de que defenderá os direitos daqueles que utilizam as suas vozes para viver.