Entidades do audiovisual respondem declarações e ações de Mario Frias

Diversas entidades do audiovisual assinaram uma carta (na íntegra abaixo) nesta sexta, 12, em resposta às recentes declarações e ações do secretário Especial da Cultural, Mario Frias.  Na última quarta-feira, 10, o secretário anunciou a implementação do Programa de Integridade da Ancine. Em vídeo postado em suas redes sociais, Frias afirmou que o programa é uma forma de dar transparência "aos processos de financiamento da atividade audiovisual e de prevenir irregularidades na aplicação dos recursos públicos em projetos para cinema e TV".

Além dos valores captados, em fase de captação ou em fase de contratação, o site da Ancine divulga o  número de projetos de cada empresa do audiovisual e enumera o ranking de produtoras que mais  acessaram recursos, além do que chama de "passivo de prestações de contas". "Não se pode examinar esses dados sem deixar de perceber uma tentativa de insinuação de que as empresas do audiovisual seriam responsáveis por conluios para captar recursos. Fica subentendido ainda que elas teriam deixado de entregar as obras e suas respectivas prestações de contas", diz a carta das entidades.  "Os dados ali expostos deixam de informar, conforme seria imprescindível, que as prestações de contas foram entregues. O que não aconteceu foi sua análise por parte da Ancine", segue o texto.

A carta defende que é a agência que deveria atuar com maior transparência diante do setor, pois existem "inúmeras informações mínimas que a Ancine deveria manter atualizadas e publicadas para que a sociedade pudesse verificar o andamento regular dos processos sob responsabilidade da Agência". Por fim, as entidades afirmam que a Ancine precisa se ater à sua missão de fomentar e viabilizar a produção audiovisual brasileira, ao invés de se dedicar a perseguir aqueles que deveria defender.

"Gerenciamento de risco"

Mario Frias anunciou na quarta a adoção de um "gerenciamento de risco" para "averiguar as  prestações de contas de empresas que concentram maiores recursos". Para as entidades, as declarações fazem com que recaia uma suspeição sobre o setor privado, o corpo técnico da Ancine e o Comitê Gestor do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA).  

Desmentidos

Ao buscar apontar "os reais interesses por trás dessa tentativa de criar um clima acusatório que recai sobre todo o setor audiovisual do país", as entidades desmentem diversas insinuações e desmentidos:  

* "Não é verdade que os recursos do FSA sejam recursos orçamentários que desfalcariam aqueles destinados à saúde, educação ou qualquer área essencial da economia de nosso país", dizem, lembrando que o fundo é mantido com recursos oriundos da Condecine, "uma taxa cobrada sobre as empresas do próprio setor: distribuidores, canais de televisão aberta e paga, telecomunicações e outros"; 

* "Não é verdade que esses recursos sejam a fundo perdido", explicando que os investimentos têm retorno ao próprio FSA; 

* "Não é verdade que esses recursos sejam 'dados' às empresas. Também não é verdade que os recursos  disponíveis 'ficam com os produtores'", uma vez que eles são concedidos para a produção de obras que geram, em média pelo menos 100 empregos diretos e 300 indiretos, além do recolhimento de impostos;

* "E não é verdade que a não análise das mais de 3 mil prestações de contas em aberto, que forma o passivo da Ancine, sejam de responsabilidade dos produtores", ao contrário, lembram, as empresas mantêm por mais de 15 anos documentos arquivados à espera de que a Ancine inicie ou finalize suas análises de prestações de contas.

Produções travadas 

O documento de entidades do audiovisual aponta que a atual gestão "nada fez para reunir o Comitê Gestor dos recursos do Fundo Setorial do Audiovisual". Como consequência, não há novos editais de recursos do setor desde 2018, "ou mesmo um planejamento claro para recursos existentes de 2019, 2020 e 2021". Além disso, lembram que a Ancine deixou de contratar, "mesmo com recursos em caixa", cerca de 700 projetos já aprovados e  selecionados em editais públicos anteriores a dezembro de 2018. Essa política, de não repassar recursos ao setor, "está quebrando as empresas Brasil afora, inclusive e principalmente aquelas fora do eixo, que supostamente o Secretário estaria defendendo em suas palavras". 

Sobre projetos em andamento – mais de 2 com recursos da ordem de R$ 2 bilhões de reais, conforme a fala de Frias – as entidades signatárias da carta afirmam que a maior parte destes recursos ou já foi investida ou está em vias de ser. "Como todos sabem, as produções, ao longo do ano de 2020, pararam pelas necessárias medidas de isolamento no combate à Covid-19. Poucas produções puderam avançar, apesar do esforço do setor em desenvolver protocolos de segurança, por conta dos altos custos. Mesmo em meio ao cenário pandêmico, encontramos dificuldades para conseguir que a Ancine prorrogue os prazos de conclusão das obras. Sim, a agência reluta em aceitar a evidência de nossa impossibilidade de abrir os sets de filmagem em plena pandemia".

Confira a carta na íntegra: 

"O Secretário de Cultura do Governo Federal, Mario Frias, anunciou nesta quinta-feira 10 o Programa de  Integridade da Ancine, cujos detalhes estão no site da Agência Nacional de Cinema. O subtítulo do  documento, "Ancine avança em medidas de transparência e gestão para prevenção de irregularidades",  sugere não haver transparência e sim irregularidades que merecem ser identificadas e corrigidas.  

Além dos valores captados, em fase de captação ou em fase de contratação, o site da Ancine divulga o  número de projetos de cada empresa do audiovisual e enumera o ranking de produtoras que mais  acessaram recursos, além do que chama de "passivo de prestações de contas". Não se pode examinar  esses dados sem deixar de perceber uma tentativa de insinuação de que as empresas do audiovisual seriam responsáveis por conluios para captar recursos. Fica subentendido ainda que elas teriam deixado de entregar as obras e suas respectivas prestações de contas.  

Os dados ali expostos deixam de informar, conforme seria imprescindível, que as prestações de contas  foram entregues. O que não aconteceu foi sua análise por parte da Ancine. Muitas delas esperam há mais de 15 anos a apreciação. Para que a sociedade tivesse clareza a respeito da lisura e da diligência das empresas produtoras de audiovisual do Brasil, seria imprescindível que o site informasse as datas  de entrega das prestações de contas. Esse dado fundamental é, porém, omitido.  

Por fim, o secretário Mario Frias afirma que irá "adotar um gerenciamento de risco" para "averiguar as  prestações de contas de empresas que concentram maiores recursos". O que ele também deixa de  informar é que os procedimentos para a contratação de todo e qualquer projeto se ativeram às regras  públicas de cada linha de financiamento. Ou seja, recai dessa forma uma suspeição inaceitável não  apenas sobre o setor privado, mas sobre o próprio corpo técnico da Ancine, o Comitê Gestor do Fundo  Setorial do Audiovisual (FSA) – composto, inclusive, por ministros do governo.  

Não se pode deixar de reconhecer que tal medida não surpreende aqueles que, há dois anos, sofrem  ataques e calúnias da parte do governo federal. É, porém, preciso que esclareçamos para a opinião  pública os reais interesses por trás dessa tentativa de criar um clima acusatório que recai sobre todo o setor audiovisual do país.  

Não é verdade que os recursos do FSA sejam recursos orçamentários que desfalcariam aqueles destinados à saúde, educação ou qualquer área essencial da economia de nosso país. Tratam-se de recursos oriundos da CONDECINE, uma taxa cobrada sobre as empresas do próprio setor: distribuidores, canais de televisão aberta e paga, telecomunicações e outros. E que na passagem pelo Tesouro, estes recursos sofrem contingenciamento de, no mínimo, 30%. Em outras palavras, quem sustenta a economia do audiovisual é o próprio setor, que ainda contribui com parte do orçamento da União. 

Não é verdade que esses recursos sejam a fundo perdido. Trata-se de investimentos que têm retorno ao próprio FSA, sócio da maioria dos projetos em que investe. 

Não é verdade que esses recursos sejam "dados" às empresas. Também não é verdade que os recursos  disponíveis "ficam com os produtores". Eles são concedidos para a produção de obras – filmes, séries,  programas de TV, etc. – previamente selecionados a partir de critérios públicos, contratar equipe, elenco, pagar todas as despesas necessárias. Em média, cada projeto gera pelo menos 100 empregos diretos e 300 indiretos (hospedagem, transporte e alimentação, entre outros), além do recolhimento de impostos em toda sua cadeia de produção. E entregam à sociedade obras como filmes, séries e outros  conteúdos audiovisuais. Muitos de enorme sucesso tanto no Brasil quanto no exterior. Nos últimos cinco anos, todos os importantes Festivais internacionais tiveram filmes brasileiros entre seus laureados. Diversos canais de TV paga e plataformas de streaming têm, entre seus maiores sucessos, produções brasileiras. 

E não é verdade que a não análise das mais de 3 mil prestações de contas em aberto, que forma o passivo da Ancine, sejam de responsabilidade dos produtores. Ao contrário: empresas mantêm por mais de 15 anos documentos arquivados à espera que a Ancine inicie ou finalize suas análises de prestações de contas. Somos reféns de um sistema perverso que inverte as responsabilidades do setor público e privado. São mais de 3 bilhões de reais à espera de análise e não se pode aceitar que se tente  macular um setor de importância indiscutível por mero desejo de criminalizar a cultura brasileira.  

Em sua fala, o Secretário Especial afirma que existem mais de 2 mil projetos em andamento com recursos da ordem de 2 bilhões de reais nas mãos dos produtores. Outra grave desinformação. Parece que os produtores estão com esta fortuna em suas mãos. A maior parte destes recursos ou já foi investida ou está em vias de ser. Como todos sabem, as produções, ao longo do ano de 2020, pararam pelas necessárias medidas de isolamento no combate à Covid-19. Poucas produções puderam avançar, apesar do esforço do setor em desenvolver protocolos de segurança, por conta dos altos custos. Mesmo em meio ao cenário pandêmico, encontramos dificuldades para conseguir que a Ancine prorrogue os prazos de conclusão das obras. Sim, a agência reluta em aceitar a evidência de nossa  impossibilidade de abrir os sets de filmagem em plena pandemia.  

E por fim, faltou dizer no pronunciamento que a atual gestão nada fez para reunir o Comitê Gestor dos  recursos do Fundo Setorial do Audiovisual, e que por isso não há novos editais públicos de recursos do  setor desde 2018, ou mesmo um planejamento claro para recursos existentes de 2019, 2020 e 2021.  Que a Ancine deixou de contratar, mesmo com recursos em caixa, cerca de 700 projetos já aprovados e  selecionados em editais públicos anteriores a dezembro de 2018. Que essa política de não repassar  recursos ao setor está quebrando as empresas Brasil afora, inclusive e principalmente aquelas fora do eixo, que supostamente o Secretário estaria defendendo em suas palavras. 

Todos os países relevantes do mundo têm uma produção audiovisual que reafirma seus valores de  identidade cultural através de obras nacionais que viajam mundo afora. Vejam o quanto a Coréia do Sul  beneficiou-se da vitória no Oscar 2020 com o filme Parasita. Dezenas de séries e filmes sul-coreanos ocupam as plataformas digitais com destaque, tornando o país mais conhecido, valorizando seus  produtos e turismo. 

É lamentável que a autoridade responsável pela defesa da cultura do Brasil tenha uma atitude tão  equivocada e que vai contra os interesses do país. Pior ainda, neste momento, em que todos ainda  estão sob os efeitos danosos do isolamento social e da interrupção de atividades. 

Assim sendo, as entidades, sindicatos e associações vêm pela presente tornar público esses  esclarecimentos e exigir que o chamado Programa de Integridade de Ancine inclua nas suas informações as datas de recebimento das prestações de contas entregues pelas empresas produtoras. Dessa forma, talvez fique claro quem necessita de um Programa de Integridade com ética e rigor. 

Reiteramos que toda a transparência de informações governamentais é não apenas louvável, mas é uma  obrigação legal e moral de qualquer servidor público, em cargo eletivo ou não. Por exemplo, o Sr. Secretário poderia começar explicando por que a Ancine, mesmo se comprometendo publicamente a divulgar mensalmente a lista atualizada dos projetos em fase de análise complementar, não mantém  procedimento efetivo de publicação de tais informações ao público. Ou poderia ainda elucidar por que os prazos determinados no regulamento para contratação de projetos do FSA não estão sendo cumpridos. 

São inúmeras as informações mínimas que a Ancine deveria manter atualizadas e publicadas para que a  sociedade pudesse verificar o andamento regular dos processos sob responsabilidade da agência. A Ancine precisa se ater à sua missão de fomentar e viabilizar a produção audiovisual brasileira ao invés de se dedicar a perseguir aqueles a quem deveria defender". 

+Mulheres – Lideranças Femininas do Audiovisual Brasileiro
ABC – Associação Brasileira de Cinematografia
ABRA – Associação Brasileira de Autores Roteiristas
ABRACI / RJ– Associação Brasileira de Cineastas Do Rio De Janeiro
ABRANIMA – Associação Brasileira das Empresas de Animação
APACI – Associação Paulista de Cineastas
ANDAI – Associação Nacional de Distribuidoras Audiovisuais Independentes
APAN – Associação dos Profissionais do Audiovisual Negro
API – Associação das Produtoras Independentes do Audiovisual Brasileiro
Associação Brasileira de Críticos de Cinema
BRAVI – Brasil Audiovisual Independente
Cinemateca Catarinense ABD/SC – Associação Cultural Cinemateca Catarinense
Colegiado Setorial do Audiovisual do RG do Sul
Coletivo FilmaRio
CONNE – Conexão Audiovisual Centro Oeste, Norte e Nordeste
EDT – Associação de Profissionais de Edição Audiovisual
Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema
FAMES – Fórum Audiovisual Minas Gerais, Espírito Santo e estados do Sul_ Paraná, Santa Catarina e Rio
Grande do Sul
FORCINE – Fórum Brasileiro de Cinema e Audiovisual
Fórum dos Festivais
Fórum de Festivais E Mostras Brasileiras No Exterior
Fórum Nacional dos Pareceristas da Cultura
Frente Dos Produtores
Manifesta Feminista
Mulheres Do Audiovisual Brasil
SANTACINE – Sindicato da Indústria do Audiovisual de Santa Catarina
SIAESP – Sindicato da Indústria Audiovisual do Estado de São Paulo
SICAV – Sindicado Interestadual da Indústria Audiovisual
SINDICINE – Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Cinematográfica e do Audiovisual dos Estados de
São Paulo, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Tocantins e Distrito Federal.
SINDAV-MG – Sindicato da Indústria Audiovisual de Minas Gerais
SINAES – Sindicato da Indústria Audiovisual do Espírito Santo
SINTRACINE – Sindicato dos Trabalhadores do Cinema e do Audiovisual de Santa Catarina
STIC – Sindicato Interestadual dos Trabalhadores do Audiovisual
WIFT Brasil – Women in Film & Television

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