Para André Sturm, presidente do SIAESP, PL da regulação do VOD aprovado abarca os eixos fundamentais

André Sturm (Foto: Divulgação)

Na última terça-feira, dia 16 de abril, foi aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal o Projeto de Lei 2.331/22, que trata da tributação das plataformas de VOD. O PL vai para a Câmara dos Deputados para ser cotejado com o PL 8.889/17, seguindo nova tramitação. 

As opiniões do setor diante da aprovação não são unânimes. A produção independente, em especial, demonstra preocupação com o baixo percentual de incidência de Condecine estabelecido (3%) e com a possibilidade de que seja abatido até 60% do valor devido à contribuição com aplicação direta de recursos equivalentes em projetos de capacitação e preservação do setor audiovisual, em produção de conteúdo brasileiro em parceria com produtoras brasileiras independentes, na aquisição de direitos de licenciamento de conteúdo brasileiro de produtora brasileira independente e na implantação e manutenção de infraestrutura para a produção de conteúdos audiovisuais no Brasil. O texto ainda traz outros pontos polêmicos e, agora, a expectativa é que as questões sejam debatidas novamente na tramitação na Câmara dos Deputados. 

Histórico 

André Sturm, cineasta, produtor, gestor cultural, diretor do Belas Artes Grupo e presidente do SIAESP e Cinema do Brasil, diverge das manifestações de diversas entidades que demandam uma abertura maior para a participação do Conselho Superior de Cinema, colegiado responsável por dar as diretrizes da política audiovisual ao Governo Federal, nos debates legislativos e que consideram a que redação dada ao PL 2.331/22 transfere recursos públicos para subsidiar as plataformas estrangeiras, entre outras questões. Poucas horas antes da votação do PL no Senado, 18 entidades do cinema e do audiovisual divulgaram uma carta demandando a participação do CSC e a revisão de pontos importantes na proposta de regulamentação do VOD ainda durante a tramitação naquela casa legislativa. No dia seguinte à aprovação, Bravi e Sicav também divulgaram um artigo no qual defendem a revisão de pontos semelhantes, mas desta vez na tramitação do PL na Câmara dos Deputados.

Para Sturm, a aprovação do projeto no Senado é uma vitória histórica, que deve ser comemorada. "A regulação do streaming será o grande evento regulatório desta década. Uma regulação bem feita significa pelo menos dez anos de incentivo e reestruturação do mercado", declarou. Para ele, é importante avaliar o histórico: o primeiro projeto de lei que versava sobre a regulação do VoD foi apresentado em 2017 – o que significa que o Brasil está há pelo menos seis anos com esse debate em curso. "O Senador Eduardo Gomes decidiu colocar essa questão embaixo do braço e fazê-la andar. Ele fez uma audiência pública incrível – foram dois dias, com a presença de 30 representantes de todo o setor, entre governo, plataformas internacionais, nacionais e pequenas, produtores, representantes do cinema comercial e autoral. A partir daí, o Senador alterou a proposta substancialmente. Ele claramente ouviu as demandas. Claro, ele é um legislador, tem o direito de acatar uma parte e, outra, não. Mas a proposta que ele apresentou absorve muito das contribuições do setor", afirmou Sturm. "Portanto, vejo como muito positiva a aprovação do projeto porque é um passo fundamental. Está aprovado no Senado do Brasil que precisa ter uma regulamentação do streaming no País. Demoramos quase sete anos para chegar aqui". 

Eixos principais contemplados 

O produtor considera que o PL aprovado traz os quatro eixos principais que a regulação do streaming no Brasil deve ter: cobrança de Condecine sobre o faturamento das plataformas, cotas de conteúdo, necessidade de algum tipo de proeminência e a possibilidade de que as plataformas possam ser obrigadas a investir diretamente na produção e aquisição de conteúdo independente parte desse valor da Condecine. Ele destaca que alguns ajustes podem ser feitos, sim – e que é exatamente isso que deve acontecer agora. "O processo legislativo tem duas casas. Você debate em uma, chega num acordo possível naquele momento, e vai para outra. Vamos de novo debater, defender nossos pontos de vista e buscar melhorias no projeto. Eu não posso concordar com quem critica o que aconteceu na terça-feira. Foi um passo histórico para o cinema brasileiro. E o debate ainda está aberto". 

Sturm aponta que uma lei, para funcionar, tem que ser simples: "É claro que tem outros detalhes que, se eu fosse fazer uma lei sozinho, colocaria. Mas uma lei simples é mais fácil de ser aplicada e controlada. Uma lei que inclui muitos detalhes e tenta prever todas as possibilidades acaba se tornando complexa e, muitas vezes, confusa, permitindo ações judiciais, dificultando a fiscalização e até seu cumprimento". Nesse sentido, ele volta a dizer que os quatro pontos essenciais estão no projeto aprovado. "Cabe a nós buscar avanços na Câmara. A dosagem precisa ser ajustada, mas os remédios já estão prescritos", compara. 

Ajustes necessários 

Entre os pontos que ele acredita que ainda precisam ser trabalhados estão justamente o percentual de Condecine cobrado – que, em sua opinião, poderia ser maior, evidentemente sobre o faturamento bruto; a cota de conteúdo, que também deveria aumentar; e a possibilidade de que parte da dívida da Condecine seja investida em "Originals", que ele não concorda. "Mas o projeto original não falava em investimento em produção brasileira independente, só brasileira. Trazia um valor muito menor de Condecine. Três é melhor do que o que temos hoje, que é zero. Ou seja: temos que compreender o que há de bom no projeto". 

Recursos para o FSA

Dentro do debate, há um ponto específico que gera grandes diferenças de opinião dentro do setor. Alguns produtores independentes acreditam que, tirando o investimento direto e todas as outras deduções possíveis da Condecine, sobraria pouco dinheiro para que o FSA faça seus editais. Sturm, por sua vez, é a favor exatamente disso. "Acredito que deveríamos ter não só 60%, e sim 70% dos recursos da Condecine como passíveis de serem aplicados da maneira que a plataforma decidir aplicar – mas eliminado a possibilidade dos 'originals' e de outras linhas do texto atual que falam em capacitação e preservação porque esse não é o papel das plataformas. É política pública, e isso sim tem de estar no Fundo Setorial", defende. 

Ele aponta que esses recursos em questão, na verdade, não iriam diretamente para o FSA. "Se fosse, eu concordaria, mas não vai. O dinheiro vai para o caixa único do tesouro – e o governo contingencia. E não é este governo. Todos os governos contingenciam recursos. O FSA hoje já tem uma arrecadação de R$ 1,2 bilhões por ano. Por que vamos aumentar essa arrecadação se a Ancine coloca no mercado, quando muito, R$ 400 milhões por ano? Não é melhor criarmos um mecanismo e fazer com que uma contribuição vá direto para o mercado?", questiona. Para Sturm, nesse caminho, as plataformas investirão na aquisição de conteúdo brasileiro independente. "Elas estarão gerando emprego e trazendo conteúdo nacional. Um determinado tipo de conteúdo, sim, e o FSA fará outro. A gente enriquece o mercado e a indústria ao criar esses diferentes guichês de recursos para as produções", explica. 

O produtor argumenta que o FSA pode criar suas linhas de investimento que contemplem a maior diversidade possível – mas que, no caso das plataformas, seria um "guichê" para outro tipo de conteúdo. "Que também gera empregos, negócios e faz a imagem do Brasil circular nas plataformas. Não acho negativo que haja esse investimento direto. Concordo em tirar certos investimentos, como os citados em capacitação e preservação. Mas esse investimento das plataformas não estaria tirando dinheiro do FSA, e sim criando um 'novo' dinheiro. Se der problema na Ancine, no governo, no Tribunal de Contas, o dinheiro continua irrigando a produção". 

Andamento do projeto

As expectativas a curto prazo de Sturm são positivas. "Conseguir aprovar a lei este ano é fundamental. Assim, ano que vem ela já estará valendo. É uma mudança que vai definir os próximos dez anos da produção brasileira", reforça. Ele acredita que, na Câmara, o debate está avançado, pois o deputado André Figueiredo já vem conversando com bastante gente da indústria. "Imagino que o projeto do Senado vá parar na mão do deputado, que vai fazer ajustes. Ele está claramente interessado no assunto, então estou otimista de que tenhamos uma aprovação na Câmara em dois meses, e acho que o Senado será rápido na volta. Precisamos chegar num entendimento em que todo mundo abra mão de alguma coisa pelo bem de aprovarmos uma lei".

Por fim, o presidente do SIAESP reconhece que há bastante conflito interno no setor quando o assunto é a regulação do VOD e reflete: "Acho que falta uma compreensão de que o processo legislativo é feito de diálogos e acordos possíveis. Não existe aprovar 'o meu projeto'. No Congresso, buscamos entendimento para chegar no melhor cenário possível. Esse é o processo. Tem coisas do projeto aprovado que incomodam algumas pessoas. Mas quantas coisas agradam? Vamos compreender o que há de bom no projeto. Estou otimista de que conseguiremos avançar". 

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