Adoção de tecnologia na produção audiovisual é legado positivo da pandemia

Nesta sexta-feira, dia 19 de novembro, lideranças femininas das áreas de direção, produção e pós-produção se reuniram num painel da Expocine 2021 para debater sobre os novos modelos de produção que se intensificaram na pandemia.

"Vivemos hoje em uma sociedade em constante aceleração. Olhar para tendências deve ser um exercício constante na sociedade como um todo, mas especialmente no audiovisual. Precisamos estar atentos às inovações na forma de consumo, produção, pensamento e criação", disse Georgia Costa, CEO da Coração da Selva, na abertura do papo. 

Durante a pandemia, a produtora continuou trabalhando e produzindo como foi possível. Nesse caminho, inovações foram extremamente necessárias – e esse exercício de adaptação deixou legados. Costa elencou alguns deles. "No início, a preocupação de todo mundo era evitar aglomerações. Para isso, trouxemos para o set tecnologias que já existiam e eram muito utilizadas na indústria da música, por exemplo, mas na produção audiovisual ainda não. Como os equipamentos dentro de gruas, com as pessoas os operando de longe, já que o intuito era evitar equipe técnica e elenco no mesmo ambiente", contou. "Essa tecnologia começou a ser usada com esse objetivo mas, agora, não conseguimos mais imaginar produções sem esse recurso. Entre as vantagens, estão a maior concentração dos atores, especialmente do elenco infantil, e a possibilidade de contar com enquadramentos nos quais não caberia uma pessoa atrás da câmera. Agora, usamos isso de forma rotineira", acrescentou.  

Outro ponto de aglomeração no set era o video assist, onde pessoas de todos os departamentos se reuniam para observar o que estava sendo filmado. Nesse caso, também já existia uma tecnologia disponível, mas que ainda não era usada, que é a distribuição do sinal do video assist para devices de todos os profissionais envolvidos – as pessoas podem, então, acompanhar as cenas por tablet, celulares e até de casa, de forma remota – a própria Costa fazia isso. Às vezes, trabalhava home office e podia acompanhar o andamento da produção no set. 

Por fim, está um aplicativo inédito desenvolvido pela própria produtora, que tem como objetivo integrar as informações técnicas do trabalho. "Produzíamos muitas documentações, boletins diários de todas as áreas da produção. Tudo isso era recolhido e entregue para a pós. Mas, muitas vezes, o trabalho desses boletins é redundante. Existem muitos aplicativos na indústria para boletins de câmera e de som, mas nesse projeto a ideia era criar um boletim digital integrado, onde todos os departamentos depositam as informações. Evita redundância de trabalho e é mais efetivo. No app, cadastramos o projeto – no caso de séries, cada episódio – e há informações sobre cada cena, controle hora a hora. Colecionamos dados em tempo real, o aplicativo integra tudo isso e gera os relatórios. Já ouvi de uma continuista que isso economizou três horas de trabalho pra ela, que tinha que ficar passando a limpo as anotações. Isso, pra mim, é a maior vitória", relatou Costa. 

"Sempre que inovações são sugeridas há resistência, desconfiança e dificuldade de adaptação. As pessoas já estão acostumadas a determinado workflow e, muitas vezes, têm a impressão de que novas tecnologias geram um trabalho a mais. Mas, passando essa barreira, o que se vê é o contrário, isto é, uma redução no tempo de trabalho", concluiu a CEO. 

Tecnologias de pós-produção remota 

Alessandra Casolari, diretora de pós-produção da Netflix, também trabalhou com inovações na pandemia e quer mantê-las na rotina de trabalho. Para ela, comunicação, integração e colaboração entre os times são os principais ganhos do período. "Espero que esses avanços não retrocedam", diz. 

Casolari destaca a implementação de soluções remotas na pós. "Uma solução super impactante pra mim foi a revisão de corte feita de forma remota. Todo mundo assistindo ao corte simultaneamente, fazendo seus comentários. Além disso, adotamos ainda soluções para revisão de mixagem remota, gravamos ADR remotamente, fizemos as dublagens… Realmente foram impactos gigantes no mercado. Em março de 2020, tudo foi feito meio no susto, do dia pra noite. Mas com os projetos que foram filmados depois de novembro, tivemos tempo de testar outras soluções. Com esse tempo, implementamos soluções mais robustas e estáveis", explica. "Destaco ainda que as tecnologias de trabalho remoto possibilitam trabalhar com talentos ao redor do mundo, multiplicando nossas possibilidades e gerando uma pluralidade que nunca tivemos antes", completa. 

A diretora menciona outro aprendizado: "Entendemos que, quando vamos usar tanta tecnologia, 100% da energia precisa estar voltada ao planejamento, a antecipação dos processos que precisam acontecer na fase de preparação e pré-produção. Acabou aquela máxima de 'a gente conserta na pós'. Agora a gente planeja durante a pré. Temos que construir o que vamos filmar antes de começar. Decupar cenas, desenhar, isso é muito importante antes de usar essas tecnologias. É essencial trabalhar com antecedência, garantindo tempo apropriado entre testes e filmagens". 

Desafios

Caroline Fioratti é uma das diretoras que viu de perto essas inovações citadas por Casolari, uma vez que foi uma das diretoras de "Temporada de Verão", uma das séries originais que a Netflix filmou durante a pandemia e que tem previsão de estreia na plataforma para 2022. A produção é da Boutique Filmes. 

"Temporada de Verão" se passa numa paisagem paradisíaca do Nordeste brasileiro. Parte das cenas foram, de fato, filmadas na região – mas boa parte foi feita num estúdio em São Paulo mesmo, com ajuda de painéis de LED simulando as locações da praia. Fioratti comandou a direção ao lado de Isabel Valiante e revela: "Num primeiro momento, nós estávamos receosas mesmo, não saberíamos qual seria o resultado. A série foi desenvolvida para ser filmada em locação, se passa numa ilha à beira-mar. É uma coisa aspiracional – afinal, na pandemia, ir à praia, vivenciar encontros, virou algo aspiracional. Mas tínhamos esse desafio de proteger a equipe e trabalhar com segurança. Fizemos as cenas seguindo todos os protocolos e utilizamos o aplicativo da Georgia para ter maior controle. Contamos muito com a colaboração de toda a equipe". 

Ao todo, a produção contou com 250 placas de LED para fazer "externas" dentro do estúdio. "Nossa maior alegria foi quando os próprios montadores disseram que não sabiam mais identificar quando era o hotel de verdade, na praia, e quando era o estúdio", brinca a diretora. 

Ela elenca alguns desafios: "Quando se trabalha com tecnologia, tem a questão dos orçamentos, que são mais caros. Além disso, não é tudo que está disponível no Brasil – algumas coisas vêm de fora e demoram para chegar. Mas o resultado é positivo. E nunca foi tão democrática essa interação entre todas as áreas da produção". 

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